Tive
um corrimento escrotal. Ao ver, pela minha janela, que chovia, desejei ser
poeta com tantas palavras e foi inevitável: escorreu pele abaixo e corpo acima
um líquido de esquizofrenia amorosa.
Eu
olhava para cada gota daquela garoa e tentava lembrar-me quando fui chamado
pelo nome, pela primeira vez. Mas só consegui esticar o pensamento até um
apelido pálido, rochoso e desnecessário: “meu anjo”. Ah, isso soa tão estranho
para alguém que não se lembra do próprio nome.
Descobri,
então, que a garoa é de uma mente tão sarcástica e sádica, que enfia letras
separadas na cabeça da gente e nos contorce ao ponto de termos escorrimentos
poéticos. Não gosto mais da garoa, prefiro a chuva!
Os
poetas são feitos de continuidade e eu me recusei a ser contínuo – ou fui
obrigado? Não me lembro. Fui recolher as roupas do varal, acender a claridade
da noite e pensei na pausa. Definitivamente, não tenho nenhuma qualidade para
ser poeta.
Gosto
da fala pausada, das frases sem fim, das palavras cortadas. Até minha memória é
cheia de lacunas e qualquer exercício que faço para relembrar só consigo saber
que esqueci... Lembrei-me: aquela noite, aquela música... Qual o nome dela
mesmo?! Ah, você sabe.
Toda
música ajuda na memória, e lembrar dói. Deveria ser proibido acessar lembranças
e ser poeta. Os dois nos alegram pela dor.
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