segunda-feira, 25 de julho de 2011

EL CASA MUDA: as palavras da inocência




Em El Casa Muda, traduzido para o português como “A Casa”, o diretor uruguaio Gustavo Ernández faz algo de muito simples e extraordinário: interagir com o público a meia luz, ou a meia câmera.

Aqui, quero poupar do que já foi dito do filme, mas dizer particularmente do véu que é desnudado no mesmo. Nesse sentido, inicio meu comentário pelo fim.

É o fim que achei, particularmente, incrível. Após todos os créditos, quando as salas de cinema já estão vazias é que muito se explica. Uma sacada inteligente e tão necessária para que nós, expectadores possamos saborear até o último momento daquilo que achamos menos importante.

Mais que uma continuidade após o “fim”, esse último suspiro da cena encobre a escuridão do ocorrido em 1944 até o arquivamento da história real.

Laura, a personagem central desvenda um pouco do que o “Amigo oculto” faz. Porém, por outro lado é apresentada uma história aparentemente simples que se passa numa casa escura com quase nenhuma iluminação (um clichê entre os filmes de terror).

A sacada do filme está em brincar com aquilo que não é explicado na película, igualmente não foi esclarecido na história real. Esse jogo que é feito, parte do pressuposto de toda a complexidade da personagem.

Laura traz em suas atitudes toda uma carga de perversidade de que foi vítima. As vítimas não são o pai ou o amante. Aliás, essa é a parte central e mais complexa da história.

Acredito que poucos expectadores se atentarão para o fato de que trata-se de uma adolescente que cresce meio ao pai e a outro homem e é o objeto da realização e fetiche tanto de seu próprio pai quanto de “seu amor”.

Uma criança que gera uma criança e um bebê que é assassinado. Uma história de violência infantil. Uma menina que é a satisfação do pai. Coincidência ou não Laura teve uma filha Sofí.
Essa busca por uma libertação de sua própria condição de escrava de tudo que lhe aconteceu, do seu amor bastardo e de sua confiança quebrada pelo pai. Além da perda de sua criança faz com que ela mantenha um único laço com essas duas vidas perdidas.

Qual o elo? A boneca. Essa boneca que é mais que a Laura ou a Sofí, mas que é a infância das duas, a destruição delas, as vidas torturadas, embaladas por uma música de ninar e um carrinho de bebê cheio de fotografias.

A liberdade de Laura é impregnada pela morte daquilo que a transformou em cativeiro. Primeiro, a morte do pai e em seguida a morte de seu amado. Porque pra ela, qualquer um poderia ferir sua dignidade, mas o pai é quem deveria velar por sua proteção. Ao passo em que esse elo se quebra não há mais o reconhecimento da entidade “pai”.

É mais que uma história contada de forma, às vezes um pouco óbvia, por vezes com uma continuação inexplicável de cenas, mas com uma simbologia e um conteúdo incrível que rende algumas abordagens na área do prazer, da violência à integridade.  


quarta-feira, 20 de julho de 2011

Partida


Sonhei que ao nascer, meus dias seriam pequenos demais para morrer.
Nasci de um suspiro tênue de um momento feliz,
A partir daí descobri que viver seria uma jornada tensa, intensa,
Um pouco insana demais para alguém tão catedrático.
Descobri, com o passar dos dias que aqueles dias foram coisas de pequeno veraneio.
Jeito de recém-chegado. Coisa de gente parada.
Um misto de ovelha e pastoreio...

Sonhei que ao nascer, meus dias seriam curtos demais para tanta vida.
Decidi não sofrer enquanto não viesse a morte.
Mas por que temer a morte?
Ela é só uma amiga distante, que nos comove só pela lembrança de nunca tê-la visto.
É aquela amiga que quando chega, completa-nos com sua presença e aí não precisamos de mais nada: só da morte!

Sonhei que ao nascer, partiria leve e tranquilo.
Esqueceria todos os vestígios dos amores que não experimentei e que por um fio...
Todos me visitariam em um só instante.
Deixaria para cada um aquela essência de perfeição que não fui, mas que insistiram em me nomear.

Sonhei que ao nascer já morreria. Feliz, por ter feito o máximo para prolongar o tão curto.
Todas as transgressões não foram para o seu amor, mas foram para o meu amor.
Todas as saudades, que jurastes entender, na verdade não entendeu. Porque minha saudade era única.
Era minha, era pra mim. Era nobre e era ingênua... igual a uma criança.

Sonhei... sonhei tanto que parti sonhando.
De tanto sonhar a amiga distante permitiu que eu acordasse antes de sua chegada.
Para quê? Para amar mais uma vez e todos os dias.



terça-feira, 19 de julho de 2011

Truco


Eu, nas minhas desventuras pela noite, em busca do tão óbvio que parece ser mágica, percebi algo de muito interessante.
Subindo a ladeira das baladas mal badaladas, entre a sobriedade e a descompostura de um mero expectador de expectativas por um copo de bebida, que percebi o movimento “truco”.
No meio da pista, estavam eles: corpos desnudados pelo próprio desejo de estar nus, campos energéticos seminus vestidos por uma masculinidade afetada, músculos rígidos, dança com um semitom de gingada, cinturas marcadas por algumas reboladas sincronizadas.
Achei interessante essa nova forma de agir: em bando. E para o bando do “truco”, que é truculento, há toda uma regra de interação, num espaço em que é por natureza GLBT.
- o negócio é o seguinte: ficam no bando, em grande círculo dançando e bebendo como apolos e dionisos até que passe por perto uma provável vítima. Essa vítima deve ter uma característica básica: ser mulher feminina. A partir daí, o segundo movimento é ir parte do bando, geralmente os machos alfas, cercam e atacam todos de uma vez, ou a “coitada” se rende ao encanto brusco dos ferozes rapazes, ou os indivíduos vão se afastando e deixando a finalização para o mais interessado.
Todos esses moços talvez sejam gays demais para irem a outros espaços ou heteros demais para tentarem com as garotas que já tem “certeza” do que querem. Pode ser que seu objetivo seja: - você, gata, precisa de um homem de verdade.
Mas quem é esse homem de verdade? O irmão, o pai, o tio, o avô ou o amigo, o gay...?
Os ataques são tão intensos e interessantes de se ver, pois parece que as vítimas ficam tontas e o seu Não é só uma questão de pegada.
Aí, foi quando percebi o mesmo movimento, só que dessa vez feito pelas mulheres. Lindas, corpos esculturais, belas maquiagens, bebidas e rebolados exuberantes.
Elas, também em círculos, mas executam sua dança fatalística de forma diferente.
  - o negócio é o seguinte: ficam dançando, rindo, expelindo de seus corpos feminilidade e quando a vítima, aquele cara que é gay-macho demais para pegar outro homem se vê no meio da cilada, mas hetero de menos para se envolver somente com uma mulher. Sim, uma cilada! Porque elas fazem o coitado dançar, ir “até o chão”, rebolar e o envolvimento é tamanho que o infeliz não percebe que está envolto num desejo fetichista do ridículo. Para elas, acho que devemos chamar de “Mana”, porque agem em manada.
Assim é que se configura um desejo de buscar o eu diferente de mim que nego ser. Tento encontrar aquilo que não ofereço e que renego. Talvez essa seja a formatação de uma tendência para os sentimentos e para os relacionamentos na era do desapego. Na era do “você é perfeito/a demais pra mim no momento”.
Há mais a declarar, mas só no próximo texto.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Não resisti à tentação

Era mais forte que eu...bem mais forte. Mas foi nesse exato momento que me senti mais humano, mais ousado, meio indecente comigo mesmo, um pouco inverdadeiro com o outro...talvez verdadeiro demais pra mim. Aí acabei descobrindo que há silêncios necessários, que há verdades contrárias e que no discurso de cada um sempre há o outro ou nós nos fingindo de ser o outro e mais: um jogo fetichista de fazer de conta...no fim, pra quê isso tudo? Para dizer é dificil...